quarta-feira, outubro 31, 2012

Jack Welch - Vencer

Jack Welch sabe como vencer. Nos seus 40 anos de carreira na General Electric liderou este grupo global com sucesso, ano após ano, em múltiplos mercados e enfrentando uma forte concorrência. O seu estilo honesto de gestão, que defende o valor de «ser o melhor», revelou-se padrão de ouro no mundo dos negócios.

Desde que Welch se aposentou das suas funções de Presidente do Conselho de Administração e de Presidente Executivo da GE, em 2001, tem viajado por todo o mundo e participado em conferências como orador, onde é questionado sobre uma variedade de tópicos. Inspirado pela vontade destas audiências, de quase 250 mil pessoas, em ouvir os seus conselhos, decidiu escrever este livro, que pretende ser uma bíblia sobre o mundo dos negócios para as gerações vindouras. Este texto dá respostas claras às questões mais difíceis que enfrentamos, quer no trabalho quer na vida pessoal.
O objectivo de Welch é falar aos diferentes níveis da organização, para empresas grandes ou pequenas, colaboradores da linha da frente, detentores de MBA, gestores de projecto e executivos seniores, entre outros profissionais. Com este livro pretende ajudar todos os que têm uma paixão pelo sucesso.
Welch inicia Vencer com uma secção introdutória denominada «O que está por detrás», onde descreve a sua filosofia de negócio. Nesta parte do livro desenvolve a importância dos valores, da fraqueza, da diferenciação e da voz e dignidade para todos. A parte central de Vencer dedica-se ao que é importante no mundo do trabalho e está dividida em três partes. A primeira aborda o interior da empresa, desde a liderança até ao recrutamento de vencedores. A segunda descreve o exterior e a concorrência. A parte seguinte deste livro é sobre a gestão da carreira: desde encontrar o emprego certo até conseguir um equilíbrio saudável entre a vida pessoal e o trabalho.
Os seus pontos de vista optimistas, onde «não existem desculpas» porque «as coisas têm de ser feitas», são contagiantes. Preenchido com relatos de experiências pessoais e escrito no seu estilo distinto, Vencer é um livro que transmite novos conhecimentos, pensamentos originais e soluções para algumas questões práticas e, por isso, mudará a forma como encara a sua vida.
Na sua edição portuguesa, o livro conta com um Prefácio de Belmiro de Azevedo:

"[...] Este livro passa igualmente a pente fino questões fundamentais para a gestão das empresas, numa linguagem directa, simples, e apela permanentemente que se passe de ideias gerais a decisões de gestão e sobretudo que a sua execução seja rigorosa. Sugere que através dos «cinco slides» que o mercado seja identificado, que os concorrentes sejam continuamente estudados, que a equipa seja constantemente renovada e que os objectivos sejam sistematicamente ambiciosos e cumpridos. Só assim se conseguirá manter um clima desafiante, que conduzirá à excelência dos resultados.
O livro Winning [...] aborda fundamentalmente duas questões - a estratégia num mundo cada vez mais diversificado e global e o desenvolvimento de carreiras para os seus principais gestores.
Porque estou especialmente sintonizado com estas duas mensagens, é-me particularmente gratificante recomendar uma leitura atenta desta obra aos profissionais de Gestão do mundo de língua portuguesa, sendo que a sua leitura também poderá ser extremamente útil e educativa para a classe política em geral.
É um livro de fácil leitura, com uma linguagem muito directa e que vale a pena ler, reler e estudar [...]".

terça-feira, outubro 30, 2012

Perda de soberania. Ainda havia dúvidas?

"Muitos governos ainda não perceberam que perderam a sua soberania nacional" - quem o diz é Mario Draghi, presidente do Banco Central Europeu.

A ideia surge na sequência das afirmações do ministro das finanças alemão, que defende a existência de um super comissário europeu com poderes supranacionais sobre os orçamentos dos Estados-membros, com capacidade de vetar esses orçamentos caso estes não cumpram as metas do défice.

"Só quando os países da Zona Euro estiverem dispostos a partilhar soberania ao nível europeu é que ganharão, eles mesmos, soberania", acrescentou Mario Draghi.

Que poderes restarão aos Estados?

segunda-feira, outubro 29, 2012

Refundação do Estado?

O primeiro-ministro Passos Coelho rezou um acto de contrição e anunciou ao país na semana passada que quer empreender, até 2014, uma reforma do Estado, que consistirá numa "refundação" do memorando de entendimento celebrado com a Troika.
Boa Pedro, excelente ideia! O país estava carente deste tipo de masturbação ideológica, faminto por experimentar novas sensações de prazer e ejacular doses incomensuráveis de esperança!
Conta connosco para levar por diante esta empreitada, sabemos que difícil, mas será certamente muito gratificante. E o país vai-te agradecer e, quem sabe, dar-te a vitória em 2015, se é que lá chegas vivo e inteiro.
Refundir é, pois, a palavra de ordem. Toca a juntar as tropas e marchar por essas instituições públicas e por esse país adentro. Não podemos permitir um Estado obeso, cheio de vícios e gorduras. Matemos todos os fungos venenosos que o corroem por dentro, pelos lados e por fora. Combatamos as pieguices e essa coisa extraordinária, mas que já leva séculos de existência, que é insistirmos nesse luxo de vivermos acima das nossas possibilidades e de termos 485 Euros de salário mínimo. Estes "pintelhos" que desgraçam a economia do país têm de ser banidos de uma vez por todas da sociedade portuguesa. Temos de renascer das cinzas, como a Fénix, para posar bem na fotografia da grande Europa da senhora Merkel e de todos os outros indigentes políticos a quem tu lambes as botas.
Por isso, antes de deixares o país e os portugueses na mais absoluta miséria económica, física e psicológica, ensaia primeiro a refundação que a seguir te sugerimos:
- Refundir meia centena de deputados que estão a mais no parlamento.
- Refundir as PPP e todas as rendas e subsídios que são uma burla para o Estado e que nos custam uma pipa de massa.
- Refundir aquelas empresas municipais que são ciclicamente deficitárias, cujas atribuições e competências são redundantes e que só servem para empregar a malta acéfala e indigente dos aparelhos partidários.
- Refundir as inúmeras fundações que representam uma multiplicação de funções do Estado e que só servem para empregar gente amiga, sem emprego e que apenas sabe viver à conta do Estado.
- Refundir os inúmeros institutos públicos que constituem uma espécie de IEFP da malta dos partidos e de ex-nomeados para os órgãos superiores da administração pública.
- E, nesta linha, refundir o escândalo que são também alguns dos vetustos observatórios que não observam nada, mas que custam milhões ao erário público.
- Refundir as mordomias principescas que graçam de uma ponta a outra da administração pública, de que as senhas de presença, os subsídios para tudo e mais alguma coisa (habitação, deslocação, representação, e mais o diabo a quatro) são apenas um ínfimo exemplo. Era preferível aumentar o salário dessa gente toda, nas devidas e contidas proporções, do que andar a subsidiar e a alimentar uma quadrilha de chupistas que só sabem mamar à custa dos impostos dos portugueses.
- Refundir o financiamento aos partidos e deixar que cada um se financie por conta própria e não à custa dos portugueses. Por que razão os autores deste Blog têm de andar a pagar as campanhas elitorais do CDS-PP quando nem sequer votam neste partido?
- Refundir um número justo e equilibrado das 4.260 freguesias do país, muitas das quais criadas em cima do joelho, por razões muitas vezes bairristas e estritamente políticas e eleitoralistas, e que são também um considerável sorvedouro de dinheiros públicos. E, no entretanto, analisar, de forma imparcial e com olhos de ver, se no Século XXI se justifica e se há dimensão e capacidade para manter 308 municípios em Portugal.
- Refundir as rendas chorudas e imorais pagas ao sector energético com o dinheiro de todos nós.
- Refundir o "ministério da dívida pública", o que não deve significar deixar de pagar aos credores, mas antes pagar segundo as nossas reais capacidades, deixando fôlego para que os portugueses possam respirar e sobreviver.
- Refundir os multimilionários custos com pareceres jurídicos encomendados aos amigos, quando não mesmo aos escritórios e/ou empresas dos próprios que os encomendam, quando sabemos que o Estado tem e pode perfeitamente utilizar os recursos de que dispõe para a sua elaboração.
- E a lista seria quase interminável...
Caro Pedro, enquanto não regurgitarmos tudo o que causa asia ao Estado, o engorda e o torna lento, burocrático e podre, não há refundação possível que nos possa valer enquanto país. Haja coragem para enfrentar as clientelas, os grupos de interesse, os parasitas que vivem à custa da "causa pública", os corporativismos e toda essa cambada de gente inútil que pulula de tacho em tacho à espera da melhor cama para se deitar, haja vontade para o fazer e verás que os portugueses serão o melhor povo do mundo e Portugal um país mais livre, mais justo e mais democrático.

sexta-feira, outubro 26, 2012

Tony Judt - Um Tratado Sobre os Nossos Actuais Descontentamentos

Tony Judt (1948-2010) fez os seus estudos do ensino superior no King's College, em Cambridge, e na École Normale Supérieure, em Paris. Foi professor de História nas universidades de Cambridge, Oxford, Berkeley e na Universidade de Nova Iorque, onde fundou o Remarque Institute, em 1995, e leccionou Estudos Europeus. Durante anos contribuiu com artigos e ensaios para várias publicações, como a New York Review of Books, o Times Literary Supplement, The New Republic, entre outras.

Para além deste Um Tratados Sobre os Nossos Actuais Descontentamentos, Tony Judt escreveu O Século XX Esquecido-Lugares e Memórias (Edições 70, 2008) e Pós-Guerra-História da Europa desde 1945 (Edições 70, 2006), a sua obra mais conhecida e com a qual foi finalista do Prémio Pulitzer em 2005 e galardoado em 2008 com o Prémio do Livro Europeu. Em 2007, Tony Judt recebeu o Prémio Hannah Arendt e em 2009 viria a ser galardoado com uma menção especial do Prémio Orwell.

Este livro, que pode ser adquirido aqui, é uma preciosidade da historiografia contemporânea, à qual não podemos ficar indiferentes. Um dos temas que o autor aborda no livro, sob o título O Culto do privado, não podia ser mais actual, pelo que aqui ficam algumas passagens do texto para servir de aperitivo a esta grandiosa leitura que desde já recomendamos aos nossos leitores:

"Com o advento do Estado moderno (especialmente durante o século passado), os transportes, hospitais, escolas, correios, exércitos, prisões, forças policiais e acesso barato à cultura - serviços essenciais que não ficam bem servidos pelo funcionamento do móbil do lucro - foram postos sob regulação ou controlo públicos. Estão agora a ser reentregues a empreendedores privados.
O que temos estado a assistir é á firme deslocação da responsabilidade pública para o sector privado sem vantagem colectiva discernível. Contrariamente à teoria económica e ao mito popular, a privatização é «ineficiente». A maioria das coisas que os governos julgaram apropriadas para passar para o sector privado estava a funcionar com prejuízo: fossem companhias de caminhos-de-ferro, minas de carvão, serviços postais ou empresas de energia, o custo de fornecê-las e mantê-las é maior do que as receitas que alguma vez se esperasse obter.
Precisamente por essa razão, esses bens públicos não eram em si mesmos apelativos para compradores privados, a amenos que oferecidos com um desconto acentuado. Mas quando o estado vende barato, o público fica a perder. Calculou-se que durante as privatizações britânicas da era Thatcher, o preço deliberadamente baixo com que bens de há muito propriedade pública foram transaccionados no sector privado resultou numa transferência líquida de 14 mil milhões de libras dos contribuintes para accionistas e outros investidores. A esse prejuízo devem ser acrescentados mais 3 mil milhões de libras em comissões para os banqueiros que negociaram as privatizações. Portanto, o Estado pagou ao sector privado 17 mil milhões de libras [...] para facilitar a venda de activos que de outra maneira não teriam tido compradores. [...] Dificilmente se pode interpretar isto como utilização eficaz dos recursos públicos.
O melhor estudo das privatizações no Reino Unido conclui que a privatização »per se» teve um efeito dificilmente modesto no crescimento económico a longo prazo - ao mesmo tempo que distribuiu regressivamente a riqueza dos contribuintes para os accionistas de companhias acabadas de privatizar. A única razão por que os investidores privados desejam adquirir bens públicos aparentemente ineficientes é porque o estado elimina ou reduz a sua exposição ao risco. No caso do Metro de Londres, por exemplo, foi accionada uma «Parceria Público-Privada» (PPP) para convidar investidores interessados a comprar partes da rede do metro. As empresas adquirentes receberam a garantia de que, acontecesse o que acontecesse, ficariam protegidas de prejuízos graves - minando assim o argumento económico em favor da privatização: o funcionamento do móbil do lucro. Nessas condições priveligiadas, o sector privado revelar-se-ia no mínimo tão ineficiente como o seu homólogo público - rapando os lucros e cobrando os prejuízos ao Estado. O resultado foi o pior tipo de «economia mista»: empreendimentos individuais indefinidamente subscritos por fundos públicos [...]. 
[Friedrich Hayek], na sua insistência para que as indústrias monopolistas (incluindo caminhos-de-ferro e fornecedores de água e electricidade) fossem deixadas em mãos privadas, ele esqueceu-se de prever as implicações: dado que nunca seria permitido a esses serviços nacionais vitais desintegrar-se, os privados poderiam correr riscos, desbaratar recursos ou apropriar-se indevidamente desles à vontade, sabendo que o governo pagaria a conta [...]".
E, para terminar, deixamos uma passagem da Introdução do livro:
"A qualidade materialista e egoísta da vida contemporânea não é inerente à condição humana. Muito do que hoje parece «natural» remonta ao anos 80: a obsessão pela criação de riqueza, o culto da privatização e do sector privado, as crescentes disparidades entre ricos e pobres. E sobretudo a retórica que vem junto: admiração acrítica dos mercados sem entraves, desdém pelo sector público, a ilusão do crescimento ilimitado. Não podemos continuar a viver assim. O pequeno «crash» de 2008 foi um aviso de que o capitalismo não-regulado é o pior inimigo de si mesmo: mais cedo ou mais tarde há-de ser vítima dos seus próprios excesso e para salvar-se recorrerá novamente ao Estado. Mas se nos limitarmos a apanhar os bocados e continuar como dantes, podemos esperar convulsões maiores nos próximos anos. E, porém, parecemos incapazes de conceber alternativas. Também isso é novo".

segunda-feira, outubro 22, 2012

Os carecas, os negócios e a política


De acordo com um estudo recentemente divulgado pelo Wall Street Journal e realizado pela Universidade da Pensilvânia (EUA), "os homens calvos são considerados mais poderosos do que os que têm cabelo".
A notícia avançada pela dinheirovivo.pt dá-nos conta de que a calvície pode ser mesmo uma vantagem no mundo dos negócios, pois envia às outras pessoas um sinal de que se fez algo de activo (rapar a cabeça). O look, para além de estar na moda, vai ganhando cada vez mais adeptos em todo o mundo.
Não podemos avaliar o rigor científico deste estudo. No entanto, fazendo fé nas suas conclusões, diríamos que o elenco governativo é tudo menos careca, à excepção, talvez, do ministro da economia, Álvaro Santos Pereira, que já começa a denotar alguma calvície em estado avançado. E também não sabemos se há uma relação efectiva entre o facto de alguém ser calvo e a sua poderosidade. Entretanto, aceitam-se apostas se a tão propalada remodelação governativa virá ou não a acontecer e, se acontecer, nos irá surpreender não tanto pela mudança dos ministros, mas pela decisão de se tornarem carecas. Se for essa a solução para o país, que venham os carecas, até porque, lá diz o ditado, é dos carecas que elas gostam mais.

sexta-feira, outubro 19, 2012

Cataplana de peixe à D. João

Ontem acordei com uma imensa saudade do mar, e decidi trazer o mar à minha mesa. Fazendo jus à cataplana que comprámos há uns anos atrás, e que havia sido esquecida inadvertidamente no fundo do armário da cozinha, não hesitei em dar-lhe o uso que ela merecia, e nada melhor que uma espécie de caldeirada pontualmente decorada com frutos do mar, para lhe dar a beleza e o sabor a mar que eu tanto procurava.


Ingredientes (para 2 pessoas):

6 postas de peixes variados (eu usei raia e safio)
Ameijoas com casca, q.b.
Camarões, q.b.
4 batatas médias
2 cebolas médias
1/4 pimento verde
1/4 pimento vermelho
4 tomates pequenos maduros
1 folha de louro
1 colher de chá de paprika
2 alhos
1,5dl vinho branco
1 ramo pequeno de coentros
Azeite, sal, pimenta e piripiri, q.b.

Preparação:

Coloquei a cataplana ao lume, reguei-a com um pouco de azeite e fui dispondo todos os ingredientes em duas camadas homogéneas: as cebolas cortadas em rodelas, o alho, os pimentos em tiras, as batatas também em rodelas, os tomates (cortados em pedaços e limpos de peles e sementes) e, por fim, os peixes. Temperei com o louro, o sal, a pimenta, o piripiri e a paprika, e dispus a segunda camada pela mesma ordem. Reguei com o vinho branco. Em cima, juntei os camarões e as ameijoas e fechei a cataplana. Deixei estufar em lume brando por cerca de 25 a 30 minutos, mantendo sempre a cataplana fechada, mas abanando-a de vez em quando. Por fim, rectifiquei os temperos e decorei com os coentros, que piquei finamente. Acompanhei esta deliciosa iguaria com um não menos delicioso vinho branco Pêra-Manca 2009, que me havia sido dado no Natal do ano passado. A combinação não podia ter sido mais perfeita.

sexta-feira, outubro 12, 2012

Um grande avião chamado Portugal

Imaginemos o emblemático avião "Jumbo" (Boeing 747) a dez mil metros de altitude, na sua velocidade de cruzeiro a caminho da América do Sul e a sobrevoar o Atlântico. Os seus potentes quatro motores e o piloto automático garantem uma viagem cómoda e confortável aos passageiros, contribuindo para uma viagem calma e sem sobressaltos de maior. Apenas pequenas turbulências sacodem o jacto de quando em vez, fazendo-o desviar-se ligeiramente da rota pré-definida, mas nada que um 747 não consiga debelar facilmente. Por fim, o avião aterra no Aeroporto Internacional de São Paulo, em Guarulhos, são e salvo, com os passageiros a recordar a maravilhosa experiência por que acabaram de passar.
Tal como neste avião, também os países possuem quatro motores essenciais que, quando combinados e compensados, impulsionam a sua economia, garantem o seu crescimento e a tornam sustentável no longo prazo. São eles: o consumo interno, a despesa pública, o investimento privado e as exportações.
Imaginemos agora que o tal avião é, na verdade, um país, e esse país se chama Portugal. Para se manter numa altitude de dez mil metros e a uma velocidade de cruzeiro - que torne a viagem agradável aos dez milhões de passageiros que nele embarcaram -, é necessário que os seus quatro motores desempenhem eficientemente o papel para que foram concebidos: levar Portugal de um ponto de partida para um ponto de chegada, com base num plano de voo milimetricamente concebido para o efeito, sem o qual muito dificilmente a rota do avião poderá ser mantida ao longo do percurso. Para isso, necessita dos seus quatro motores a funcionar, sem os quais o avião tem mais dificuldades em enfrentar as turbulências e as adversidades que vai encontrando pelo caminho, tornando, deste modo, a viagem mais instável e atribulada para os passageiros.
Mas, a dado momento desta viagem transatlântica, alguns dos passageiros apercebem-se que os motores do consumo interno e do investimento privado ficaram anémicos e pegaram fogo, ficando a tal ponto inutilizados que o comandante do avião não tem outra alternativa senão desligá-los. Pouco tempo depois, é a vez do motor da despesa pública começar também a falhar, obrigando o comandante, uma vez mais, a seguir as normas de segurança e a desligá-lo. Após uma análise minuciosa ao modo de funcionamento técnico do aparelho, a tripulação conclui que teria havido uma fortíssima obstrução das válvulas que conduzem o combustível aos motores, pelo que enfrentam agora a pior adversidade que jamais um piloto pode enfrentar: pilotar uma enorme aeronave apenas com um motor - o das exportações -, e, mesmo este, a apresentar falhas estruturais extremamente perigosas. O avião, apenas com um motor a funcionar, acabou, infelizmente, por se despenhar, e jaz hoje no fundo do oceano.


Dado tratar-se de um avião de fabrico norte-americano, as investigações às causas do acidente ficaram a cargo da NTSB (National Transportation Safety Board), que é a agência que investiga os acidentes aéreos. Dois anos após o trágico acidente, a NTSB escreveu no seu relatório: "falha irreversível de três dos quatro motores da aeronave, devido a obstrução permanente das válvulas que permitem o acesso do combustível aos motores. A deficiência do funcionamento destas válvulas ficou a dever-se a um erro dos construtores do aparelho, pelo que se atribui como causa directa para o acidente a falha humana".
No fundo do oceano, jazem os restos mortais dos dez milhões de passageiros, cujas famílias nunca receberam até hoje um pedido formal de desculpas...

Creme de espinafres com croutons

Ontem, foi dia de fazer uma nova panela de sopa, porque a anterior havia acabado! Em casa, não dispensamos este riquíssimo complemento alimentar, que tem de estar sempre presente na mesa das nossas refeições. Com os espinafres quase a amarelarem no frigorífico, antecipei-me, e fui rabuscar as minhas notas de culinária à procura de uma simples receita de família que me havia sido ditada, por telefone, nos meus tempos de estudante em Lisboa, já lá vão uns bons anos. Felizmente, encontrei-a, tendo posto logo mãos à obra.

Foto: Blog iNovOurém

Ingredientes:

500gr de abóbora
3 batatas médias
1 cebola
1 alho francês
2 cenouras
1 embalagem de espinafres
Sal e azeite a gosto

Preparação:

Numa panela ao lume com água a ferver, em lume médio, juntei todos os legumes cortados em pedaços pequenos para mais rapidamente cozerem. Depois de cozidos, triturei-os um pouco com a varinha mágica. Coloquei então o azeite, e finalizei a trituração até obter um creme brilhante e consistente. Por fim, adicionei os espinafres, previamente lavados, temperei de sal e reduzi o lume para o mínimo, para cozer por mais cinco minutos. Dicas: se o azeite for adicionado antes de os legumes estarem completamente triturados, obtem-se um creme mais aveludado e brilhante. Para finalizar e ganhar textura, na hora de servir pode decorar o creme de espinafres com croutons (levados ao forno e temperados com um fio de azeite e ervas aromáticas a gosto). E, voilà, bom apetite!

quarta-feira, outubro 10, 2012

Porque é que eles se abonam tanto?

O Secretário de Estado do Ensino Superior, João Filipe Cortez Rodrigues Queiró, e a Secretária de Estado da Ciência, Maria Leonor de Sá Barreiros da Silva Parreira, emitiram um Despacho datado de 11 de Janeiro de 2012, através do qual nomeram Helena Isabel Roque Mendes para, no âmbito dos seus gabinetes, exercer funções de apoio à Rede Informática do Governo e de interface com o Centro de Gestão da Rede Informática do Governo. Pode ler-se no referido despacho que a nomeada auferirá uma remuneração mensal de € 1.575,00, actualizável na mesma percentagem do índice 100 da escala salarial das carreiras do regime geral da função pública, acrescida do subsídio de refeição que estiver em vigor.


Mas, o nº 3 do despacho determina que, nos meses de Junho e Novembro, para além da mensalidade referida no número anterior, será paga outra mensalidade de € 1.575,00, a título de abono suplementar!
Seja lá o que for o abono suplementar, parece-nos que coincide na perfeição com os subsídios de férias e de Natal castrados, numa primeira fase, aos funcionários públicos, reformados e pensionistas, e, numa segunda fase, também aos trabalhadores do sector privado. Há, portanto, dois pesos e duas medidas, cidadãos de primeira e cidadãos de segunda.
Finalmente, o despacho a que se faz referência produziu os seus efeitos a partir de 28 de Junho de 2011 (poucos dias após o PSD ter ganho as eleições), sendo válido pelo prazo de um ano, renovável, até à sua caducidade, conforme o previsto na parte final do artigo 11º do Decreto-Lei nº 262/88, de 23 de Julho, o que significa na prática que apenas caducará com a cessação de funções do membro do Governo, ou seja, dos Secretários de Estado que o subscreveram.
É caso para perguntar: porque é que eles se abonam tanto?

Pantominices económicas

1. O italiano Mario Draghi, presidente do Banco Central Europeu, afirmou ontem que o processo de ajustamento de Portugal "está a ter lugar mais depressa do que o esperado, a economia está a reequilibrar-se de uma base puramente de consumo privado para uma economia mais orientada para as exportações, a competitividade está a melhorar, os custos unitários do trabalho estão a descer e o défice da balança de transacções correntes está a baixar, e tudo isto são sinais de progressos"!
2. Também ainda ontem, Jean-Claude Juncker, presidente do Eurogrupo (o que será o Eurogrupo e para que serve?), dizia que estava "muito impressionado com o que o Governo português está a fazer" e que "o programa de ajustamento português está no «bom caminho»".
3. Já esta manhã, e em Macau, o governador do Banco de Portugal, Carlos Costa, também dizia que "estamos no bom caminho", que o "esforço de ajustamento da economia portuguesa tem sido muito considerável, mas os frutos começam a aparecer sob a forma de uma acentuada correcção das contas externas e da melhoria progressiva das condições de financiamento do tesouro português". No seu discurso, que pode ser lido na íntegra aqui, referiu ainda que há "progressos muitos importantes em matéria de reforço das condições de estabilidade do sistema financeiro: temos agora bancos mais capitalizados, mais transparentes, menos alavancados do que há um ano atrás".


4. De resto, os indicadores disponíveis confirmam as pantominices económicas avançadas por tão ilustres figuras: o consumo privado e a actividade económica em Portugal estão em queda há vinte meses consecutivos, com o primeiro indicador a cair em Agosto 4,9% e a actividade económica a contrair 2,3%.
Portugal está, de facto, no bom caminho, na opinião deles, claro: competitividade a crescer (?) com base em salários baixos, actividade económica de rastos e uma banca fortalecida e pujante (resta saber para emprestar dinheiro a quem ou a que economia). Poderão até ser sinais animadores e de progresso aos olhos desta tecnocracia europeia e nacional ideologicamente indigente, mas à custa do sacrifício e da miséria de milhares ou milhões de portugueses. 

domingo, outubro 07, 2012

Chili com carne à minha moda

Sou um curioso da cozinha e já há bastante tempo que me apetecia confeccionar um dos pratos mais típicos do México, o famoso Chili com carne. Hoje, foi o grande dia e o momento de pôr à prova a minha curiosidade e os meus dotes culinários. Para quem gosta de desafios e não tem medo de sabores ousados e intensos, aqui fica a minha receita e, desde já, votos de bom apetite!



Ingredientes para 4 pessoas:

500gr de carne de novilho picada
210gr de polpa de tomate
1 lata (pequena) de feijão encarnado cozido
1 lata (pequena) de feijão manteiga cozido
1 cebola média (picada)
2 dentes de alho (picados)
1/4 pimento verde (picado)
1/4 pimento vermelho (picado)
1 cubo caldo de carne
1 colher (chá) de pimenta preta moída
1 colher (chá) de oregãos
1 colher (chá) de alho moído
1 colher (chá) de piripiri moído
1 colher (sopa) de molho picante chili
1 colher (sopa) de paprika
1 colher (sopa) de açucar
1,5dl de vinho tinto
1 folha de louro
1 ramo de coentros frescos
Queijo ralado a gosto
Azeite (2 colheres de sopa) e sal q.b.

Preparação:

Coloquei um tacho ao lume com o azeite, ao qual, depois de aquecido, juntei a cebola, o alho e os pimentos para refogar cerca de cinco minutos, até a cebola estar translúcida e os pimentos amolecidos. Seguidamente, acrescentei a carne e deixei-a mudar de cor. Depois, adicionei o vinho tinto, o cubo de caldo de carne, as especiarias, o louro, a polpa de tomate, o sal, o açucar e metade dos coentros finamente picados. Deixei refogar em lume médio por mais cinco minutos. Adicionei os feijões e rectifiquei os temperos. Baixei o lume para o mínimo, tapei o tacho e deixei cozinhar lentamente por cerca de uma hora. Fui mexendo de vez em quando e juntei um pouco de água quente para o preparado não ficar demasiado seco. Por fim, e já na hora de servir, decorei o meu chili com o queijo ralado e os restantes coentros, também finamente picados. Acompanhei com arroz branco.

sábado, outubro 06, 2012

Ainda o 5 de Outubro

Foto: Expresso

Para além da cantora lírica e da mulher que se queixava da sua pensão de 227 euros, que, iludindo a segurança, conseguiram penetrar na cerimónia privada das comemorações do último 5 de Outubro como feriado nacional - pelo menos na era de Passos Coelho (já que António José Seguro, por seu lado, já garantiu aos portugueses que, se e quando for eleito primeiro-ministro, irá repor, pelo menos, o feriado comemorativo da Implantação da República) -, outro insólito momento marcou as festividades, com as mais altas individualidades da nação a hastearem a bandeira nacional ao contrário, para espanto de um povo já à beira de um ataque de nervos.
Não sabemos se foi obra do acaso ou se houve algum gesto intencional e provocatório nesta acção. Mas, a verdade é que também o país está de pernas para o ar, o que torna este episódio uma infeliz coincidência e um contributo para delapidar ainda mais a já muito abalada confiança que os portugueses têm nos seus representantes políticos. No meio de um mar de trapalhadas, o hastear da bandeira nacional ao contrário será seguramente uma gota no aceano, mas não é um pormenor que devamos desprezar. 

sexta-feira, outubro 05, 2012

5 de Outubro de 1910

Foi há 102 anos que José Relvas (1858-1929) proclamou a República da varanda da Câmara Municipal de Lisboa. A monarquia constitucional havia sido derrubada, e proclamada então a Iª República. Hoje, ao mesmo tempo que assinalamos a passagem de mais um aniversário deste importante marco histórico para Portugal, depedimo-nos igualmente da celebração desta data como feriado oficial no nosso país, decidido por decreto pelo governo, sob os auspícios da "TROIKA" e tendo em vista o crescimento económico e a competitividade da economia e das empresas portuguesas.


Oxalá que este objectivo não se venha a revelar contraproducente, e que a redução da despesa do Estado, também sentida na educação, não apague, de vez, dos manuais escolares dos nossos jovens estudantes a referência ao 5 de Outubro de 1910 e a tudo aquilo que ele representa para a nossa memória colectiva. O futuro o dirá.

quinta-feira, outubro 04, 2012

Nicolau Santos e a austeridade de um país empobrecido


Esta é a análise eloquente de Nicolau Santos às novas medidas de austeridade anunciadas ontem por Vítor Gaspar, Sua Excelência o Ministro de Estado e das Finanças do Governo de Portugal. O mesmo que disse hoje no parlamento esta angélica frase: "O Povo Português revelou-se o melhor povo do mundo e o maior activo de Portugal"! O que falta nos bolsos dos portugueses sobra na iluminária pérfida dos nossos governantes.

Ourém mantém IMI longe do mínimo em 2013

Uma das manchetes do Semanário Regionalista da Beira Baixa do passado dia 27 de Setembro referia que a Câmara de Castelo Branco vai manter em 2013 o Imposto Municipal sobre Imóveis, vulgo IMI, no mínimo. Trata-se, certamente, de uma medida que visa obviar a já elevadíssima carga fiscal que impende sobre os portugueses, e que irá ser fortemente agravada em 2013, tal como ontem anunciou o senhor ministro das finanças. No meio deste novo pacote de austeridade, encontra-se a eliminação da chamada "Cláusula de Salvaguarda" referente ao IMI para a generalidade dos proprietários (com excepção dos de menores rendimentos), o que na prática significa que em 2013 a factura a pagar às finanças no que ao IMI diz respeito vai sofrer um agravamento tal que irá apanhar muitos de surpresa. Honra seja feita a alguns municípios do país, que já anunciaram que não vão mexer nas taxas do imposto (ou irão mantê-las no mínimo) para não sobrecarregar ainda mais as famílias proprietárias de bens imóveis. Neste grupo restrito, encontra-se a já citada Câmara de Castelo Branco, mas também, e a título de exemplo, os municípios de Monção, Alcoutim e Óbidos.


No que toca à Câmara de Ourém, o Edital nº 122/2010, dá-nos conta de que os valores relativos às taxas do IMI, à Derrama sobre o IRC e à participação variável sobre o IRS dos contribuintes do município, a aplicar em 2011, foi de 0,35% sobre os prédios urbanos avaliados nos termos do Código do Imposto sobre Imóveis (CIMI), 0,70% sobre os restantes prédios urbanos e 0,80% sobre os prédios rústicos (isto, relativamente ao IMI); quanto à Derrama sobre o IRC (lucro das empresas), a taxa geral foi de 1,4%, sendo que para as empresas com um volume de negócios igual ou inferior a 150 mil euros a taxa foi de 1,25% (taxa reduzida); finalmente, a participação variável sobre o IRS dos contribuintes do município foi de 5%.
Em 2012, as taxas mantiveram-se iguais às praticadas no ano anterior, com excepção da taxa sobre os prédios urbanos avaliados nos termos do Código do Imposto sobre Imóveis (CIMI), que sofreu um aumento, passando de 0,35% para 0,375%.
Para 2013, as taxas de IMI vão manter-se nos 0,375% para os prédios urbanos avaliados nos termos do Código do Imposto sobre Imóveis (CIMI), em 0,70% para os restantes prédios urbanos e 0,80% para os prédios rústicos. Há, porém, uma novidade para o próximo ano: a Câmara Municipal aprovou por unanimidade "a redução em 50 por cento das taxas urbanísticas no ano de 2013, para os prédios urbanos degradados e/ou devolutos", noticiava o jornal Notícias de Ourém na sua edição de 14 de Setembro último. A medida visa permitir aos proprietários destes prédios degradados a sua reabilitação.
Conclui-se, portanto, que em Ourém as taxas de IMI vão manter-se inalteradas em 2013 para a generalidade dos proprietários, mas longe do mínimo legalmente admissível (actualmente, os municípios podem fixar as taxas de entre um intervalo que vai de uma taxa mínima de 0,20% a uma taxa máxima de 0,40%).
Adaptando o título do jornal, diríamos que: Ourém mantém IMI longe do mínimo em 2013.

terça-feira, outubro 02, 2012

Filho da puta

Ainda o caso do estudante universitário que, alegadamente, chamou filho da puta ao primeiro-ministro...

Qualquer pessoa com bom-senso sabe que chamar filho da puta a alguém não é uma atitude correcta, embora saibamos que quem ainda não o fez, que atire a primeira pedra. A universidade, na qual ocorreu o alegado insulto ao primeiro-ministro quando este a visitava, decidiu instaurar um inquérito ao aluno em questão, aquele mesmo que as televisões amplamente divulgaram a ser prontamente abordado pelo chefe da segurança pessoal do primeiro-ministro e a ser "detido" para identificação.

E o que as televisões também mostraram, sobretudo a TVI, foi um chefe de segurança arrogante, tremendamente desorientado a interpelar o tal jovem estudante de forma igualmente desproporcionada e a fazer lembrar os tempos da PIDE.

Acrescente-se a isso a cena lamentável do mesmo chefe da segurança pessoal do primeiro-ministro a insurgir-se contra um repórter de televisão, tratando-o por tu - como já se conhecessem há muito tempo -, agredindo-o física e verbalmente, só porque este, no exercício da sua profissão e no quadro da liberdade de imprensa, o estava a filmar enquanto decorria a "detenção" do jovem universitário, e temos os ingredientes necessários para duvidarmos da proporcionalidade dos meios utilizados pela polícia para atingir os seus fins.

Não queremos dizer, no entanto, que estamos de acordo com falta de educação ou que chegámos a um ponto em que vale tudo só porque estamos descontentes com o rumo que o país está a levar. A decência das palavras é um imperativo da vida em sociedade e, como tal, aquele jovem deveria ter sido mais recatado quando se referiu ao primeiro-ministro.

Mas, a prepotência das polícias também deve ser contida, e reconduzir-se à sua função, que é garantir a segurança e a ordem pública. Será que este jovem, por muito que tenha errado - e errou -, constituia um problema tão grave de segurança e ordem pública? E o repórter de televisão não estava a cumprir o seu direito / dever de informação?

Foto: Diário de Notícias

É verdade que o governo anda completamente desnorteado, a ponto de não saber já distinguir o essencial do acessório, a não descortinar a fronteira entre a legalidade e a ilegalidade, entre o que constitui uma ameaça séria e um gesto inofensivo... Mas, se chegámos a este ponto é porque algo vai mal neste governo, algo não corre bem, e isso pode pôr em causa até a própria democracia. E quando começamos a vislumbrar casos de arrogância e prepotência como aqueles que vimos naquela universidade, então se calhar é chegado o momento de reflectirmos sobre o modelo político, económico e social que queremos para Portugal. Já vamos tarde, mas ainda vamos a tempo.

A Pátria Lusitana

"Um povo imbecilizado e resignado, humilde e macambúzio, fatalista e sonâmbulo, burro de carga, besta de nora, aguentando pauladas, sacos de vergonhas, feixes de misérias; um povo em catalepsia ambulante, não se lembrando nem donde vem, nem onde está, nem para onde vai; um povo, enfim, que eu adoro, porque sofre e é bom, e guarda ainda na noite da sua inconsciência como que um lampejo misterioso da alma nacional, reflexo de astro em silêncio escuro de lagoa morta [.].

Uma burguesia, cívica e politicamente corrupta até à medula, não descriminando já o bem do mal, sem palavras, sem vergonha, sem carácter, havendo homens que, honrados na vida íntima, descambam na vida pública em pantomineiros e sevandijas, capazes de toda a veniaga e toda a infâmia, da mentira à falsificação, da violência ao roubo, donde provem que na política portuguesa sucedam, entre a indiferença geral, escândalos monstruosos, absolutamente inverosímeis no Limoeiro. Um poder legislativo, esfregão de cozinha do executivo; este criado de quarto do moderador; e este, finalmente, tornado absoluto pela abdicação unânime do País [...].

A justiça ao arbítrio da Política, torcendo-lhe a vara ao ponto de fazer dela saca-rolhas.

Dois partidos sem ideias, sem planos, sem convicções, incapazes, vivendo ambos do mesmo utilitarismo céptico e pervertido, análogos nas palavras, idênticos nos actos, iguais um ao outro como duas metades do mesmo zero, e não se malgando e fundindo, apesar disso, pela razão que alguém deu no parlamento, de não caberem todos duma vez na mesma sala de jantar.

[...] Desde a crise do ultimatum inglês, que tanto podia significar uma onda de vida nova como o estertor dum moribundo, resvala a nação, dia a dia, ao letargo estúpido da indiferença. Estará morta? Estará cataléptica? O futuro, breve talvez o vai dizer.

Mas na opinião do mundo, já Portugal não existe. Dura, mas não existe. Dura geograficamente, mas não existe moralmente. A Europa já considera isto uma coisa defunta, espólio a repartir, iguaria a trinchar. Salva-nos da gula dos comensais a rivalidade dos apetites. No dia em que se harmonizem devoram-nos.

Como resistir? Pela força física? Impossível. Não há balas nem libras, não há ouro nem ferro. Qual o meio então? Um único: a força moral. Não vale tudo, mas vale alguma coisa...

[...] Qual era, pois, a grande missão de um governo em Portugal? Fazer de quatro milhões de espíritos um só espírito, juntar quatro milhões de vontades numa só vontade. Porém, os homens que há muito dirigem os destinos da Nação, últimos fantoches do constitucionalismo agonizante, quase sempre democratas vazios aos 20 anos e cínicos redondos aos 40 anos, são incapazes de um plano de governo, gerado numa filosofia superior, amoldado a uma razão prática luminosa e traduzido em factos por uma vontade inabalável e contínua".

Guerra Junqueiro, in "Pátria" (1896)


É confrangedor que 116 anos depois de este texto ser escrito, continuemos no mesmo marasmo e na mesma pendência de sentimentos. Já não é apenas uma questão de forma ou de estilo. Trata-se de sobrevivermos a esta avalancha que nos atira montanha abaixo e que nos irá estatelar diante da nossa embaraçosa impotência.
Vivemos um tempo não só de reflexão, mas também de acção. Não nos podemos resignar como se o nosso próprio destino fosse uma fatalidade que nos transcende. A nossa Pátria Lusitana anda à deriva, anda a saque, e nem a nossa chama de glória poderá ceder ante o poder dos mais fortes. Como diria Guerra Junqueiro, somos uma Pátria de dez milhões de espíritos que têm de juntar a sua vontade numa só vontade. E difundir e partilhar a mais nobre dessas vontades, que é o orgulho imenso de ser português
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