sexta-feira, outubro 12, 2012

Um grande avião chamado Portugal

Imaginemos o emblemático avião "Jumbo" (Boeing 747) a dez mil metros de altitude, na sua velocidade de cruzeiro a caminho da América do Sul e a sobrevoar o Atlântico. Os seus potentes quatro motores e o piloto automático garantem uma viagem cómoda e confortável aos passageiros, contribuindo para uma viagem calma e sem sobressaltos de maior. Apenas pequenas turbulências sacodem o jacto de quando em vez, fazendo-o desviar-se ligeiramente da rota pré-definida, mas nada que um 747 não consiga debelar facilmente. Por fim, o avião aterra no Aeroporto Internacional de São Paulo, em Guarulhos, são e salvo, com os passageiros a recordar a maravilhosa experiência por que acabaram de passar.
Tal como neste avião, também os países possuem quatro motores essenciais que, quando combinados e compensados, impulsionam a sua economia, garantem o seu crescimento e a tornam sustentável no longo prazo. São eles: o consumo interno, a despesa pública, o investimento privado e as exportações.
Imaginemos agora que o tal avião é, na verdade, um país, e esse país se chama Portugal. Para se manter numa altitude de dez mil metros e a uma velocidade de cruzeiro - que torne a viagem agradável aos dez milhões de passageiros que nele embarcaram -, é necessário que os seus quatro motores desempenhem eficientemente o papel para que foram concebidos: levar Portugal de um ponto de partida para um ponto de chegada, com base num plano de voo milimetricamente concebido para o efeito, sem o qual muito dificilmente a rota do avião poderá ser mantida ao longo do percurso. Para isso, necessita dos seus quatro motores a funcionar, sem os quais o avião tem mais dificuldades em enfrentar as turbulências e as adversidades que vai encontrando pelo caminho, tornando, deste modo, a viagem mais instável e atribulada para os passageiros.
Mas, a dado momento desta viagem transatlântica, alguns dos passageiros apercebem-se que os motores do consumo interno e do investimento privado ficaram anémicos e pegaram fogo, ficando a tal ponto inutilizados que o comandante do avião não tem outra alternativa senão desligá-los. Pouco tempo depois, é a vez do motor da despesa pública começar também a falhar, obrigando o comandante, uma vez mais, a seguir as normas de segurança e a desligá-lo. Após uma análise minuciosa ao modo de funcionamento técnico do aparelho, a tripulação conclui que teria havido uma fortíssima obstrução das válvulas que conduzem o combustível aos motores, pelo que enfrentam agora a pior adversidade que jamais um piloto pode enfrentar: pilotar uma enorme aeronave apenas com um motor - o das exportações -, e, mesmo este, a apresentar falhas estruturais extremamente perigosas. O avião, apenas com um motor a funcionar, acabou, infelizmente, por se despenhar, e jaz hoje no fundo do oceano.


Dado tratar-se de um avião de fabrico norte-americano, as investigações às causas do acidente ficaram a cargo da NTSB (National Transportation Safety Board), que é a agência que investiga os acidentes aéreos. Dois anos após o trágico acidente, a NTSB escreveu no seu relatório: "falha irreversível de três dos quatro motores da aeronave, devido a obstrução permanente das válvulas que permitem o acesso do combustível aos motores. A deficiência do funcionamento destas válvulas ficou a dever-se a um erro dos construtores do aparelho, pelo que se atribui como causa directa para o acidente a falha humana".
No fundo do oceano, jazem os restos mortais dos dez milhões de passageiros, cujas famílias nunca receberam até hoje um pedido formal de desculpas...

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