O valor da esperança
O texto que se segue foi publicado na Edição de 10 de Janeiro de 2014 do Jornal Notícias de Ourém, o qual constitui a sequência de textos que irão sendo ali publicados e aqui transcritos na íntegra.
"Coluna do Meio
O valor da esperança
Portugal acordou no
passado dia cinco de Janeiro em alvoroço com a notícia da morte prematura de
Eusébio da Silva Ferreira, a que se seguiu a consternação generalizada entre os
portugueses. Setenta e um anos não é uma idade avançada, embora também não seja
propriamente a “flor da idade” ou a “ternura dos quarenta”. E, conhecendo-se os
problemas de saúde que o “Rei do Futebol”, o nosso “Pantera Negra”, vinha
sofrendo há já algum tempo, que o levaram, aliás, várias vezes ao hospital com
prognósticos muito complicados e reservados, a conjugação destes factores foi,
enfim, fatal para aquele que é considerado o melhor jogador português da sua
geração e de todos os tempos, e, por isso, uma referência e um símbolo
nacional.
Num tempo em que
desesperamos por encontrar referências e símbolos nacionais, onde rareiam
líderes carismáticos e timoneiros aguerridos, conscientes e visionários, eis
que surge agora um novo “mito” para marcar a simbologia da nossa história.
Eusébio não era um mero ex-futebolista do Sport Lisboa e Benfica e da Selecção
Nacional, era um jogador de Portugal e do mundo.
Nem a propósito, quer o
Presidente da República, quer o Primeiro-Ministro, apressaram-se a vir a
público demonstrar o seu pesar e enaltecer esta grande figura do desporto e do
futebol. Afinal, parece que os nossos governantes ainda sabem reconhecer a
humildade e a honestidade que caracterizaram este homem em vida, que partiu de
Moçambique atrás do sonho de jogar num grande clube de futebol, nunca perdendo
a simplicidade das suas origens, nem a forma natural de encarar o
relacionamento com os outros ou a garra que emprestava quando entrava num campo
de futebol. Ficará indelevelmente marcada na nossa memória a memorável exibição
de Eusébio nos Quartos-de- Final do Mundial de 1966, em Inglaterra, marcando
quatro dos cincos golos no jogo contra a Coreia do Norte, que mudou o resultado
e deu a vitória a Portugal. Oxalá este mesmo Portugal, enquanto país, continue
doravante a viver no presente e no futuro muitas vitórias como esta, que muito
nos enobrecem.
A morte e o funeral de
Eusébio traz-me também à memória a lembrança de outros momentos recentes e
marcantes da história do nosso país, tão díspares, como sejam o Euro 2004 ou a
morte de Amália Rodrigues e José Saramago. Em todos estes acontecimentos, quer
sejam eles eventos desportivos e culturais ou exéquias fúnebres, existe um
denominador comum que merece destaque e é da maior importância: é a capacidade
intrínseca que o povo português tem de se solidarizar com uma causa, de
reconhecer o talento dos seus ícones ou artistas (do Eusébio, da Amália e de tantos
outros), ou de, “pura e simplesmente”, apoiar as cores da bandeira nacional. O
Povo Português é um povo certamente destemido, mas que acredita igualmente em
valores e em causas. De resto, a nossa história ilustra-o bem, e faz jus à sua
historicidade e bravura.
A solidariedade que o
povo português prestou, no passado dia de Reis, ao “Rei Eusébio”, é apenas mais
uma demonstração do orgulho nacional e do carinho que todos sentimos pelo
“Pantera Negra”. Mas, prova também que, colectivamente, reconhecemo-lo como um
líder carismático, competente, mas humilde, e que, ironicamente, se tornou
grande através da sua própria simplicidade. Quaisquer que sejam as causas,
contanto que razoáveis e justas, somos um povo que sabe reconhecer o valor dos
nossos símbolos, somos patriotas e damos as mãos por aqueles que ainda nos
fazem ter esperança".
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